terça-feira, 27 de novembro de 2012

Lista de blogs


Coloquei ao lado uma lista de blogs. O número é reduzido porque o objectivo não é distribuir “palmadinhas nas costas” esperando receber algumas de volta mas apenas indicar aqueles blogs que são minhas leituras habituais e de ondo posso aprender alguma coisa. Desnecessário será dizer que não sou obrigado a concordar com tudo o que seja publicado nestes blogs. Aqueles cuja principal actividade mental é concordar ou discordar de outros não passam de imaturos que procuram algum conforto grupal, incapazes de são de suportar a solidão de uma vida intelectual.

Portugal, a Alemanha e a Crise

Em férias pela região do Douro, perguntava-me um turista canadiano se, afinal, os portugueses manifestavam-se porque achavam que não tinham de pagar o dinheiro que tinham pedido emprestado. Disse que isso era verdade para certas pessoas mas não para outras. Não me era possível, numa conversa de circunstância, explicar toda a situação, como tentarei fazer aqui. Outra pergunta que se pode colar a esta é a seguinte: o que querem os portugueses da Alemanha? Será que nós, portugueses, deixamos de ser um povo honrado e passamos a ser um bando de adolescentes mimados, achando que temos o direito a tudo o que quisermos sem termos de prestar qualquer satisfação a quem quer que seja? Quem assiste aos noticiários pensará que é efectivamente essa a situação, porque diariamente surgem peças jornalísticas mostrando grupos reivindicando algum tipo de benefício para si sem mostrar qualquer preocupação por aqueles que seriam obrigados a pagar a despesa concomitante. São também constantes as notícias de greves gerais ou de algum sector específico, que são um conhecido estratagema revolucionário de destruição da economia. Mas sabemos num estudo recente que 80% dos portugueses nunca fez greve e no dia-a-dia percebemos que as pessoas vão aprendendo a viver com menos posses sem estarem sempre a queixar-se por isso, sem que isto signifique algum tipo de aprovação do desempenho da classe política. Então, se queremos perceber o que se passa, temos que ir para além das cortinas de fumo lançadas pelos jornalistas e optar por métodos mais básicos, tais como olhar em voltar e descrever o que vemos, relacionando isso com algumas informações elementares e facilmente comprováveis por qualquer um.

Quando avaliamos a posição da esquerda radical, dos sindicalistas e de muitos comentadores “moderados” deparamos com uma avaliação simplista, que diz que Portugal não fez nada de errado nos últimos anos – ou então foi obrigado a cometer erros por entidades externas – e, sendo assim, a crise nacional tem que ser resolvida com a solidariedade europeia. Então, acham estas pessoas, para tudo se resolver basta que a chanceler Merkel dê ordem de recolhimento à “austeridade” e a substitua por um pacote de estímulos. Pode parecer que estou a fazer uma descrição simplista, mas não tenho dúvidas que concepção que muitos opinadores têm sobre como funcionam estas coisas, quando despida da argumentação vazia usada apenas como arma psicológica, é até mais básica que isto. Veja-se, por exemplo:


Trata-se de uma carta aberta à chanceler Merkel, escrita por gente de esquerda activista mas não propriamente radical. Bruno Bettelhein, caso fosse vivo, teria aqui material para uma nova edição da Psicanálise dos Contos de Fadas, uma vez que não saímos do território da fantasia pueril. Quando questionada sobre os protestos dos portugueses, Merkel teve resposta fácil: o acordo de governação que está em vigor em Portugal não tem nada ver com ela, foi assinado pelo governo português e pela troika. Ou seja, acusar a Alemanha de forma simplista tem o risco desta ilibar-se também simplisticamente.

Para assacarmos as verdadeiras responsabilidades, necessitamos de um quadro mais alargado, com uma escolha apropriada de eventos. Nos últimos 40 anos Portugal tem sido governado por partidos sociais-democratas, cujas diferenças se esbatem quando têm funções de governo. Todos acreditam no dirigismo económico e nas virtudes dos défices acumulados como estímulo ao crescimento. Contudo, os próprios ideólogos socialistas da construção europeia perceberam que a unificação política podia estar em risco se o socialismo económico fosse longe demais, e em 1992 o Tratado de Maastricht definiu para os países signatários um limite da dívida pública de 60% do PIB. Curiosamente, este foi o tratado que instituiu a União Europeia – um projecto declaradamente político – e abandonou o projecto menos ambicioso da Comunidade Económica Europeia. Um dos elementos fundamentais na união política era precisamente a união monetária, pelo que se tornava importante, numa fase inicial, ter uma moeda estável, e daí as regras para disciplinar as contas dos vários países.

Entre 1985 e 2004 a dívida portuguesa oscilou, aproximadamente, entre 50 a 60% do PIB, o que constituiu um desempenho medíocre, mas muitos condenavam, ainda assim, a “ditadura do défice”. A partir de 2004 a dívida portuguesa ultrapassou o limite dos 60% do PIB, e daí em diante cresceu vertiginosamente, atingindo 71,6% em 2008, quando rebentou a crise financeira internacional, chegando praticamente a 120% do PIB em 2012. Esta constatação elementar serve para mostrar que o endividamento do governo de José Sócrates começou bem antes da crise financeira, ao contrário do que alguns ainda tentam argumentar. A crise financeira internacional serviu apenas para agudizar um fenómeno que já era notório. Além disso, sabemos que se tratou de um endividamento em despesas largamente irrelevantes, como em dispendiosas auto-estradas em zonas onde não passa ninguém, quando não em negociatas ruinosas feitas à medida de alguns amigos. Os culpados disto são fáceis de identificar e mais tarde direi o que deveria ter sido feito com eles.

Contudo, tudo fica mais interessante quando sabemos que Portugal não era caso único, até porque a Grécia se nos adiantou, e todos sabiam que os países do sul da Europa não estavam de boa saúde financeira. Os organismos europeus deixaram passar impunemente os países, como Portugal e a Grécia, que ultrapassaram o limite da dívida, e alguns dirigentes chegaram a confessar que todos sabiam que vários países apresentavam contas falsas, pelo que a situação real ainda seria pior do que o anunciado. Como se não bastasse, as próprias agências internacionais de rating fingiram que nada se passava e continuaram a dar classificações elevadas às dívidas dos países, até o colapso ser iminente. Os idiotas de serviço olham para tudo isto e exclam que se tratava de uma crise fabricada, no que acertam, mas acham que foi fabricada apenas no final de 2008, com a falência dos bancos americanos, e depois com a descida “injusta” dos ratings das dívidas de vários países. Mas é óbvio que a crise foi cozinhada durante muito tempo, num misto de expansão do estado social juntamente com políticas ruinosas de recurso ao crédito, cuja entrada do euro em circulação tornou fácil aos países do sul da Europa, para além do problema estrutural internacional do abandono do padrão-ouro.

Chegamos agora à fase de lançar algumas conjecturas. Todos sabem que uma dívida quando atinge um certo valor não é só ela se torna impossível de pagar, os próprios juros associados já são por si incomportáveis. Este foi, de resto, um estratagema muito usado para criar situações de escravatura depois desta ter sido oficialmente abolida. Esta situação insustentável estava claramente a ocorrer com Portugal e noutros países. É crível que ninguém tenha percebido que se estava a cozinhar uma crise europeia, para mais quando anos antes se tinha estabelecido a importância de limitar a dívida dos vários países? Isto seria supor que os detentores do poder ao nível europeu sabem menos que o cidadão comum, que não ignora que as dívidas são perigosas, quando é notório que, pelo contrário, são os poderosos que estão em posse de informações que nem sequer são concebíveis para o homem do povo.

Se recuarmos um pouco no tempo, vemos que em 2005 o projecto da Constituição Europeia teve que ser abandonado devido aos referendos na França e na Holanda, e sabemos que esta constituição constituiria um passo quase que definitivo para o fim das nações e para o nascimento de um super-estado europeu fictício e de carácter totalitário. Precisamente nessa altura começaram a ser trabalhadas outras vias para chegar ao mesmo fim de forma mais discreta. Por um lado, começou a ser preparado o Tratado de Lisboa, que aumentava a integração europeia (um eufemismo para a perda de soberania por parte das nações) de uma forma psicologicamente mais aceitável do que impingir uma constituição para toda a Europa. Por outro lado, fecharam-se os olhos ao endividamento crescente dos países do sul da Europa, sabendo que era apenas uma questão de tempo até estes começarem a solicitar o resgate financeiro por parte do FMI, lançando assim uma sensação de desnorte por toda a Europa (isto em sintonia com uma crise financeira internacional, que servia também outros fins). Quando Portugal pediu o resgate ao FMI, vários comentadores “isentos” falavam de algumas soluções naturais para a crise: criação do cargo de ministro das finanças para toda a Europa; orçamentos nacionais fiscalizados pelas cúpulas europeias e assim por diante. Ou seja, tentou forçar-se o aprofundamento da união política apostando no desespero das pessoas.

Mas nem tudo correu como estava previsto, e ao invés dos povos se virarem para a Europa, viram-se para si mesmos, e as gentes do norte começaram a acusar as do sul e vice-versa, pelo que ao invés do reforço da união temos o risco de implosão da União Europeia. Contudo, o próprio espectro do fim da Europa há muito que é um argumento recorrente para o avanço do projecto europeu, nem que seja para dizer, como tantas vezes ouvi, que ou avançamos para uma Europa mais unida ou vamos entrar todos em guerra outra vez. Por isso suspeito que os socialistas fabianos que tentam construir de forma tecnocrática e sem dor uma Europa uniforme, mais uma vez estarão a tentar aproveitar-se dos socialistas radicais que promovem greves e manifestações violentas, porque tudo isso é um argumento para aceitar a mão ordenadora da “Europa”, ainda que tudo me pareça uma pretensão ingénua, já que é um caminho que apenas pode favorecer, no longo prazo, os projectos do califado universal e do movimento eurasiano de russos e chineses.

Nisto tudo onde entram os alemães? Em primeiro lugar, se alguém sabe dos perigos do desgoverno financeiro são eles, mas tudo lhes pareceu bem enquanto os países de sul endividaram-se para comprar os produtos da indústria alemã. É muito instrutivo andar pelas estradas de Portugal e ver a quantidade de carros de luxo alemães. Por outro lado, a crise europeia serviu para aumentar o poder político da Alemanha, porque no momento do aperto todos se viram para quem manda mais, e esse, por essa razão, passa a mandar ainda mais. Penso que as elites alemãs estão a fazer um jogo perigoso, porque se alguns políticos e alguns empresários estão a ganhar muito com tudo isto (não necessariamente dinheiro, mas sobretudo poder de influência), o contribuinte alemão apenas perde e não está disposto a pagar as dívidas dos países do sul. Por isso, a Alemanha tão facilmente estará a mandar na Europa como poderá no momento seguinte se fragmentar, porque também tem as suas Catalunhas.