Tal
como as árvores, os países podem morrer sem que alguém dê por
isso durante muitos anos. Para efeitos de raciocínio, entendo aqui a
morte de um país ou de uma nação – as precisões ficam para
mais tarde – como aquele ponto de não retorno em que não é
possível mais indireitar o estado de coisas sem que haja uma
refundação nacional, talvez só possível em diáspora. Obviamente
que não se trata aqui de fazer algum tipo de previsão científica
mas de deambular por um campo simbólico que nos permita vislumbrar
as razões mais profundas, sem entrar por uma busca de causas
remotas, que nos levaram até aqui.
Portugal
morreu no dia 15 de Setembro de 2012, data da manifestação contra a
troika e contra o governo, devido ao corte de ordenados que a
subida da TSU implicava. Como todas as manifestações, foi
organizada pela extrema-esquerda e apoiada de forma natural por toda
a comunicação social. A convocação pelo facebook
precipitou uma adesão maciça, e todo o país se mobilizou, ricos e
pobres, incultos e sábios, socialistas e liberais. A unanimidade
contra as últimas medidas do governo, assim como contra o resgate da
troika, seria uma coisa positiva se acreditássemos na remota
hipótese de todos terem percebido o que se passa: ou seja, todos
perceberam os erros cometidos; todos compreenderam a gravidade da
situação e o longo caminho que nos espera; todos sabem quais os
caminhos de saída e as formas de os trilhar, incluindo a maneira de
superar os obstáculos e os imprevistos.
Mas
se nos recusarmos a crer nesta espécie de omnisciência colectiva,
somos forçados a encarar esta unanimidade de forma mais sombria, e a
desconfiar se não estamos em presença de um tipo de estupidez
colectiva de consequências irreversíveis. Não me refiro
propriamente à estupidez dos manifestantes, muitos deles reagindo de
forma compreensível a mais uma espoliação, mas à estupidez da
generalidade dos comentadores, que tanto mais falaram quanto menos
raciocinaram. Passados alguns dias, disse para mim mesmo que esta
tinha sido a mais socialistas das manifestações que alguma vez
existiram em Portugal. Mas nem tudo estaria perdido se assim fosse,
dado que seguir de forma consciente um caminho, ainda que errado,
permitiria mais tarde corrigir a trajectória, precisamente pelos
escrúpulos que à consciência se ligam. Mas depois percebi que era
muito mais grave, que as pessoas tanto querem – seguindo a
desorientação reinante nas classes pensantes – um Estado
omnipresente como um Estado mínimo, querem ser totalmente livres
desde que severamente agrilhoados, querem voltar para uma Idade do
Ouro ao mesmo tempo que abominam tais fantasias, querem o fim da
crise assim como a sua eternização... A lista podia prosseguir
indefinidamente. Não se tratam de desejos contraditórios, tão
característicos do ser humano. Trata-se de uma marcha deliberada
para o abismo, surgida da coragem emprestada pelo colectivo.
Mais
tarde tratarei de concretizar estas imagens, que por ora parecerão
apenas toscas pinceladas poéticas a retratar um certo espanto.
Sem comentários:
Enviar um comentário